Capítulo II: Entre sessões Plot in Irídia | World Anvil
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Capítulo II: Entre sessões

Asfadar, 18 de Giáteo de 1587

— Você não é meu senhor e, se eu disser que fico, é porque fico. — Algo na voz de Kraal soava duro e, ao mesmo tempo, jovial.
— Essa responsabilidade é minha, minhas emoções venceram minha razão. — Respondeu Kai de maneira quase inaudível.
— É, foi uma estupidez o que você fez... — ela pausou e mirou o chão — ...mas que erga a lança quem nunca agira assim ao menos uma vez.
Kai não respondeu e apenas arrastou o que um dia havia sido uma pessoa viva, com sonhos e planos e peculiaridades só dele, para um espaço aberto por entre as árvores ao lado da capela. Ele se pôs a cavar com as próprias mãos. A aimari o imitou, em silêncio. Os dois cavaram em silêncio. Os grilos chilreavam em silêncio.
Veddra e Barboffa chegarm à mansão do Lorde Giustino. Lorde era uma palavra estranha para se referir ao jovem que não devia ter visto muito mais de vinte invernos. Eles foram até o quarto onde ele se encontrava, a despeito de ferido e acamado, concentrados nos próximos movimentos. Havia mapas e notas espalhadas pela vasta cama onde ele descansava e Benigno se sentava à escrivaninha separando outros documentos das diversas bandagens ensanguentadas que agora habitavam cada canto do quarto, acendendo e reacendendo as velas nos candelabros.
"Capitão Orsini", ele adereçou Barboffa com um sorriso, cuidadoso para utilizar o nome e não a alcunha, "É um prazer conhecê-lo, a despeito das circunstâncias.
Barboffa assentiu com a cabeça.
— O mesmo lhe digo, meu lorde.
— Houve um avanço, mas não algo que o vá animar — Disse Veddra num tom grisalho. O lorde ergueu as sobrancelhas e o duque continou — Seu capelão está morto. Entendo que ele era querido pelos aldeões. Ele estava por trás dos desaparecimentos, algo do que, surpreendentemente, não fui informado assim que pus os pés aqui.
Giustino suspirou e baixou o olhar.
— Todos gostavam do velho clérigo. Até eu.
— Meus lordes, eu e os guerreiros que me acompanham nos colocamos aos serviços dos senhores para investigar o des... — Barboffa foi interrompido pelo Emissário de Veddra que pousara no peitoril da janela. Vedra o recebeu com uma suave carícia e deu-lhe uma pequena guloseima que ele tirou do bolso do colete. Depois, desvencilhou o bilhete da pequena bolsa presa ao seu arnês. Abriu o pergaminho, leu, guardou-o e voltou-se para o capitão.
Isen oferece uma espada, mas apenas ao braço que é forte. Sua majestade, o rei, enviou dois destacamentos para fortificar San Giatto e Grameldo, sendo este último, provavelmente, o próximo burgo a ser cerceado. Precisamos envi...
— Eu vou até Grameldo coordenar as tropas — Disse o lorde Giustino, interrompendo o duque e tentando, com dificuldade, se levantar.
— Você não fará nada disso, assim como não irá mais me interromper enquanto eu falo. — Veddra retrucou em tom cortante. — Você está num vilarejo seguro e escondido cuidando dos refugiados do fiasco de Bastelli. Você não vira as costas para a sua terra, pequeno lorde, não cuspa no túmulo do seu pai. Minha missão ainda é encontrar o príncipe, então, estamos, eu e você, confinados a Valmarone até que isso seja cumprido. Depois, vamos até Savezzo para entregarmos o moleque a Casterga. Nesse meio tempo, temos um prisioneiro para interrogar. Depois disso, Bruzzi, cai sobre você a tarefa de levá-lo até Grameldo para termos uma moeda de troca, se é que os serávios são honrosos o suficiente para que isso faça qualquer diferença.

Kitara e Vallgrin conversam no estábulo da mansão, tentando focar suas atenções aos animais e não aos criados que olhavam por cima dos ombros. Kitara limpa o sangue de Vallgrin e o dos cavalos que se injuriaram na luta do dia anterior. O rangárdio se apruma na sua cama de feno improvisada e conversa com dificuldade, tomando um chá de cogumelos medicinais de sua própria cuia.(Diálogo pode acontecer no Discord)
 

Olvadar, 19 de Giáteo de 1587

 
Uma, duas, três flechas. Das três, apenas uma chegou ao alvo e, ainda assim, longe do centro.
— É sorte — disse um rapaz cujos primeiros fios de barba ainda tímidos pediam licença para aparecer. O tom amigável, bastante diferente do restante do vilarejo, adocicando a frase relativamente crua — Você levanta esse braço assim, inspira e depois solta a flecha junto com o ar.
Kraal não estava completamente satisfeita e não sorriu para ele, mas sua frustração, ela percebeu, era de dentro para dentro, e não para fora. Ela ergueu a flecha e, no último segundo, exalou o desaponto na ponta da flecha.
Certeira, central. Ela olhou com satisfação para o rapaz e se percebeu sorrindo. Ele retribuiu, deu-lha um par de tapinhas no ombro e saiu assobiando.

O dia raiava quando Kitara encontrara Kai no meio do caminho para o centro do vilarejo. Ele a deu bom-dia e ela respondeu com algo entre um rosnado e uma bufada. Mesmo assim, Kai sorriu. Kitara não se afastou.
O ar no centro era pesado e fúnebre. As notícias corriam e, não fossem hóspedes do lorde Giustino, possivelmente estariam tendo que conversar com a lâmina do machado daqueles lenhadores. Mesmo assim, Kai sorriu.
— Olha, a gente sabe que algumas pessoas estão desaparecendo. A gente só quer trazer seus entes queridos de volta, mas precisamos de alguma coisa — Ele disse a uma senhora que passava com uma cesta de figos. Ela apertou o passo franzindo a testa. Kitara fez menção de detê-la, mas Kai segurou levemente seu braço fazendo que não com a cabeça.
Ao chegarem à ponte, depois de algumas fugas e olhares temerosos, os dois se depararam com um senhor que erguia um arco curto mal construído tentando atirar flechas na direção de um bando de patos que se banhavam preguiçosos do outro lado do riacho. As flechas não chegavam nem na metade do rio e os patos mal se preocupavam também. Grasnavam entre si, caçoando do velho. Gargalhavam alto quando, de supetão, um brilho prateado passou por entre eles. Gritos, penas, patos voando para todos os lados, mas um deles caiu no chão. Sua cabeça rolou para um lado e o corpo para o outro. Kitara atravessou a ponte calmamente para reaver sua adaga e o corpo do pato.
— Qualquer informação, meu senhor. — Disse Kai no tom mais suave que conseguia — Algo me diz que o rapto do príncipe tem alguma ligação com os aldeões sumidos. Talvez estejam todos vivos e bem...
Kitara entregou o pato decapitado ao velho com um sorriso maroto no canto esquerdo da boca.
— Esse é cortesia.
O velho olhou para o presente e depois para os jovens. Suspirou.
— Eu não sei de nada e, assim como muitos, vejo alguns irem e não voltarem. Mas também vejo alguns irem e voltarem. O capelão era um deles, mas... — ele abaixou a voz — ...a amante dele também. Ela se chama Antonnea, vende frutas no mercado nos Asfadares e Grisbadares. Mora ao lado do moinho. Não falem que eu falei.
Kai beijou os pulsos do homem e o agradeceu, com pressa. Kitara já estava no meio do caminho em direção ao moinho.

Cinco horas de galope morro abaixo num cavalo emprestado não era uma viagem prazerosa. Eu nasci para o mar, não para isso, pensou Barboffa durante grande parte desse tempo. Ao desmontar, o cavalo expressou seu descontentamento com um puxão da sela, que enroscou no pé do capitão, fazendo com que ele caísse de mal jeito, torcendo o tornozelo. Ele murmurou um xingamento baixinho, como se o cavalo fosse se ofender.
Após alguns metros mancando, Barboffa avistou um esquife atracado na praia entre duas pedras com um par de homens distraídos jogando dados. Mais adiante, no mar, a vista de uma nau matizada de um azul úmido, a orgulhosa bandeira rubronegra oscilando na maresia e o imponente nome em negro pintado no casco: CVS Lídia. Era uma visão de orgulho, de patriotismo, mas, mais do que isso, um retrato de um de seus únicos lares reais.
Os marinheiros se empertigaram ao avistar o almirante, que os adereçou assim como o fazia com todos da tripulação: pelos nomes.
— Imiliano, Damazio, bons ventos, meus amigos.
— E para o senhor, capitão.
— Como vão as garotas?
— Ao seu comando, capitão. Duas naus destacadas de volta para a Crássia para levar as novas e carregar conscritos e uma coca inconspícua guardando o farol de Pilarozza para garantir que a baía fique aberta.
— E quem temos aqui?
— Além do Lídia, temos o Strata, o Madre e o Vendetta.
— E Emissários?
— A bordo do Lídia, conforme o senhor havia instruído. Ordens?
— Desçam a bandeira e sigam o Selbo para o sul. Como mercadores. Instrua que o Peretti envie um Emissário para mim amanhã cedo — Ele retirou o chapéu e deu para os subalternos. — Comunicaremo-nos assim.
Os homens bateram continência.
— Bons ventos, capitão!
— Faremo-nos bons, senhores. Pela Cálvia.
Até o cavalo, agora, estava inspirado.

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