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Vargh

A sombra de uma mão

by Vargh

Enquanto o grupo se reúne furtivamente no pequeno corredor, as sombras tomam o salão abaixo.
Dentre o bruxulear da pouca luz, é possível se ver apenas as pedras e um pouco do brilho de uma água parada.
 
O monge pisca lentamente os olhos, mal acreditando que conseguiu seu objetivo: a Lightbringer está em suas mãos.
 
Ainda assim, como o mago Neeznar alegou: o poder da maça está preso, quase adormecido em algum lugar. E o caminho para despertá-la é limpando o salão abaixo das escadas íngremes ao seu lado.
 
Seguindo as estratégias definidas pelo grupo, Ahman e Vargh avançam, buscando a criatura enorme indicada por Neeznar e Nundro, antes avistada rapidamente por Huragash.
 
Vargh consegue seguir sorrateiramente pela parede, enquanto Ahman tenta avançar para o meio da sala, mas um barulho ecoa...
 
Uma respiração pesada enche o ar e, quase instantaneamente, as luzes parecem acender em todo o salão.
 
Pedras recobrem todos os lados. Um lago toma um dos cantos do salão e não parece ter profundidade ou levar perigo. Ao fim das águas, há uma espécie de pequeno altar com imagens goblins que não chamam muito a atenção do monge.
 
A respiração pesada vem de um enorme Dragonborn que, ao se virar, é reconhecido por ambos: Zor'Varuk, um companheiro de aventuras prévias que decidiu ficar pelas minas encontradas nas montanhas de Wyvern.
 
Vargh já sentira o poder do fogo, mesmo que então amigo, e conta com a água em volta para ganhar alguma vantagem num cenário extremo, mas o posicionamento de Ahman, também pego de surpresa, é desfavorável e a lealdade fala mais alto.
 
Em segundos, o restante do grupo se junta e o monge pode começar a respirar aliviado por imaginar que ele o goblin terão a ajuda imediata do anão e seu escudo.
 
No entanto, é claro para todos que Zor'Varuk está em um estado de decomposição e não parece se lembrar dos velhos amigos e conhecidos.
 
Vargh sente a Lightbringer quase tremer em suas mãos enquanto o coração bate cada vez mais rápido, perdendo o ritmo apenas ao perceber que Gungnir foge do plano traçado e não se dirige para proteger Ahman, correndo na direção da água e tentando chamar Zor'Varuk.
 
Em estado de quase morte, o dragonborn avança em direção ao Goblin e desfere um ataque brutal, derrubando-o.
 
Vargh corre, desesperado, e tenta ajudar no contra-ataque
 
O grupo consegue derrotar o velho companheiro, transformado por alguma magia em um ser horrível e quase sem vida.
 
O monge se dirige rapidamente ao pequeno goblin, que já provara seu valor e lealdade, e tenta ajudá-lo.
 
Enquanto todos mapeiam os próprios ferimentos e Ahman recebe mais cuidados, Vargh sente novamente uma grande vibração vinda da maça.
 
A Lightbringer parece ciente de que o dragão-zumbi que guardava o salão fora derrotado e Vargh percebe as águas se movimentando.
 
Se dirigindo em direção ao altar goblin, ele sente cada vez mais energia fluindo pela sua mão.
 
Ao se aproximar ainda mais, o altar começa a tremer e seus olhos parecem enganá-lo: o que era um pequeno altar pagão dos goblins se transforma, aos poucos, em uma visão bela e simples com traços do templo de onde o monge fora criado.
 
Saindo da água e subindo no altar, seu estômago começa a formigar e, quando ao centro do cenário uma imagem surge em meio à pedra, Vargh sente a energia se espalhar pelo seu corpo.
 
"É Ela: Shar está aqui!"
 
Vargh vê a imagem da deusa surgindo em meio às pedras, com toda a beleza e escuridão que apenas Ela poderia possuir.
 
E é nesse momento que a escuridão se expande e toma o mundo à sua volta.
 
O salão desaparece, a dor latejante em seu pulso, onde a mão fora decepada, some imediatamente.
 
E Vargh sente uma nova sensação: proteção.
 
A escuridão o envolve como um ventre materno. Seu coração bate no ritmo de uma gargalhada maníaca, uma gargalhada que nunca saíra das bocas do jovem elfo.
 
E onde havia medo, raiva e dor, só existe plenitude.
 
A escuridão que o abraça acalma o coração do monge e, aos poucos, ele sente o cheiro de damas da noite no ar.
 
Enquanto seus pulmões se enchem de prazer, uma voz suave e delicada como cabelos sedosos atinge sua mente:
 
*"Mais um grande evento se aproxima e o tecido da magia há de ser abalado.*
 
*Combates ferozes, poderosos inimigos de eras passadas e aliados do presente estão agora amarrados em seu destino.*
 
*Os lordes reclamarão seus tronos e você, Vargh, será o meu escolhido na luta entre as trevas e a luz.*
 
*Sob o céu da lua minguante, silenciosa como as aranhas, a escuridão fará mais uma de suas investidas.*
 
*Durma tranquilo pois esse será apenas o começo de sua próxima missão.*
 
*E a Shadow Weaver será sua mais nova companheira nesse caminho."*

 
Aos poucos, Vargh sente a escuridão diminuindo.
 
Como as teias de uma aranha se rasgando delicadamente, seu corpo volta a um estado de calmaria, mas a luz retorna a brilhar através de suas pálpebras.
 
Ele ouve murmúrios e gritos, mas nada importa.
 
Todos os sentidos do jovem elfo estão focados no que resta Dela. Passando por todo seu corpo, a escuridão se despede de cada centímetro de pele em direção aos seus braços.
 
O monge, ajoelhado e com o corpo estendido em direção à estátua à sua frente, começa a abrir as mãos, retomando a consciência...
 
E a escuridão se demora um pouco mais, concentrando-se em seu ferimento.
 
Sem acreditar, onde antes havia apenas a sensação de uma mão decepada, Vargh vê uma sombra. Shar lhe deixara mais do que ele merecia, um presente que ele nunca imaginaria: Ela lhe dera uma nova mão.
 
Flexionando os dedos e olhando para um punho escuro, Vargh sente a energia correndo por seu braço e escuta:
 
- O que foi isso?
 
O monge se vira e enxerga Gundreen, Huragash, Gungnir, Lanre e Ahman observando-o.
Aparentemente, sua experiência com Shar fora notada pelo grupo de alguma forma.
 
Enquanto olha para todos, Vargh sente uma vontade profunda de sorrir, mas um barulho vindo da escadaria chama a atenção de todos.
Neeznar e Nundro, ouvindo o barulho e, provavelmente através da magia, percebendo que o monstro que tanto temiam fora derrotado, estão descendo os degraus em direção ao salão.
 
Gundreen solta uma exclamação alta, alegre, e Vargh o acompanha enquanto ele corre para abraçar Nundro.
 
No entanto, ao se lançar em direção ao irmão, um som rápido ecoa e um barulho de ar sendo expelido rapidamente retumba nos ouvidos de todos.
 
Gundreen, com o corpo ainda obscurecendo Nundro, perde as forças nos joelhos e começa a escorregar em direção ao chão.
 
Ele mal balbucia algumas palavras, mas seu rosto surpreso começa a se congelar enquanto seus amigos entendem o que aconteceu.
 
Uma lámina é vista nas mãos de Nundro e a calmaria deixa o corpo de Vargh.
 
Todos começam a se movimentar, desorientados pelo acontecimento, enquanto Nundro e Neeznar se preparam para a investida do grupo.
 
Vargh sente a escuridão tomando seu corpo lentamente, empunhando a, agora, Shadow Weaver com cada vez mais força, a batalha se inicia.
 
O mago e o anão se defendem bem e aproveitam o despreparo dos outros.
 
Gungnir, Huragash e Ahman sofrem golpes pesados enquanto tiram sangue dos inimigos, mas caem ao chão.
 
Lanre e Vargh estão por um triz, mas a magia do meio elfo e a nova mão sombria do monge se provam suficientes para derrotar o mago.
 
E com um movimento quase desesperado, sentindo a força de Shar correndo por seu corpo, Vargh se movimenta verticalmente, correndo pela parede, e golpeia a cabeça do mago drow com a Shadow Weaver, que cai sobre os degraus e cria uma grande poça de sangue, gotejando enquanto segue seu caminho até o lago.
 
Lanre finaliza Nundro, obtendo a vingança por Gundreen.
 
Quando o corpo do anão desfalece, sua forma se altera em uma massa cinzenta estranha, assim como o drow que estava com os bugbears.
 
Sem tempo para pensar muito mais, os dois correm para salvar seus amigos e, ao perceber que todos estão bem e com doses do brandy distribuídas para que recobrem a consciência, as atenções se tornam para o corpo de Gundreen.
 
O anão já parece sem vida e, ao toque, seu corpo é frio.
 
Vargh se inclina sobre o corpo sem vida dele, aconchegado apressadamente em meio às pedras, mesmo com o cheiro forte da bebida que o beberrão saboreava com tanto gosto.
 
Enquanto todos lamentam o ocorrido e procuram entender o que acontecera, analisando a massa disforme que um dia fora Nundro para eles, a mão feita de sombras passa despercebidamente pelo rosto do elfo, limpando uma lágrima que não haveria de ser vista.
 
Vargh nunca tivera familiares ou amigos.
 
Sua criação na Ordem da Lua Cheia não permite mais do que a adoração à Shar e talvez fosse isso: ele fora punido por se afeiçoar ao grupo, mesmo que à sua maneira.
 
Gundreen não fora um amigo desde o primeiro contato, pelo contrário, sua língua solta criou mais barreiras em Vargh do que qualquer outro do grupo.
 
No entanto, o tempo e a camaradagem do soprador de dados perfuraram, aos poucos, as barreiras que criara.
 
Talvez fosse o momento onde, desconcertado, ofereceu uma luva ao monge.
 
Ou senão, foi a preocupação genuína que demonstrava por sua família e amigos.
 
Vargh se compadecera ao ver Gundreen encontrando o corpo de seu irmão e, de alguma forma, invejava aquela conexão que nunca tivera a oportunidade de ter.
 
Se lembrando da sensação de minutos atrás, o ventre de Shar que o abraçara com tanto conforto, Vargh não pôde deixar de imaginar que era assim que Gundreen se sentira ao encontrar Nundro vivo.
 
E nada poderia ser mais aterrador para o monge que a visão nos olhos do anão ao perceber que havía sido atacado por uma pessoa que amava tanto. As dúvidas que deveriam ter consumido seu coração enquanto caía ao chão, lentamente, imaginando o que havia acontecido.
 
Vargh imaginou, então, como seria se ele mesmo morresse duvidando de Shar e, por um segundo, o desespero o acometeu.
 
Onde antes existia calmaria, depois raiva, só havia tristeza agora.
 
Shar existia e olhava por ele. A mensagem era clara.
Mas o destino de Gundreen era por demais cruel. A luz que reluziu em seus olhos, trazendo a dúvida durante a morte, não deveria brilhar nos olhos de ninguém.
 
E foi com essa certeza que o monge sentiu novamente a mão feita de sombras pesada demais para seu braço.
 
A Shadow Weaver volta a vibrar levemente e a mão sombria adquire um peso que Vargh não consegue ignorar, peso esse que ele sabe não ter sido causado devido ao esforço do combate.
 
Ele se volta para o altar de Shar, sombrio, porém perfeito aos seus olhos. E segurando mais uma lágrima, anda novamente em direção às águas.
 
O monge se ajoelha e dessa vez inicia uma oração sentindo o coração quebrado.
 
Coração que se sentira completo pela primeira vez na vida poucos minutos antes, agora sem esperanças.
 
Fechando os olhos, ele se concentra em sua nova mão, dessa vez relembrando a sensação que tivera ao acordar e ver que fora decepado.
 
E é pensando nisso que sua mente começa a se dirigir à Ela:
 
*"As sombras consomem a luz, não o contrário.
Como Seu servo, não posso ser mais grato pela benevolência e escuridão lançadas sobre mim.*
 
*Atuo como Sua arma e ferramenta e ofereço todas as minhas capacidades e forças para cumprir as Suas missões.*
 
*Mas é graças aos que me rodeiam que fui capaz de alcançá-las e, mesmo que a luz ainda não tenha deixado seus corações completamente, por me ajudarem eles também são Suas armas e ferramentas.*
 
*É por isso que peço, humildemente, que a escuridão demonstre suas forças novamente.*
 
*Não me importa que os objetivos de todos tenham que ser alterados e o destino tome um novo rumo, a mina poderá ser deixada no esquecimento e o anão seguirá outro caminho.*
 
*Mesmo assim, ofereço o que tenho de mais valioso, um presente das próprias sombras, um remédio para a pior das minhas dores.*
 
*Nada irá mudar meu rumo e minha convicção, mas a Sua benevolência pode angariar ainda mais fervor e apoio. Ambos tão necessários para alcançar os objetivos impostos.*
 
*Obrigado, Minha Senhora.*
 
*Que as sombras estejam com Gundreen."*

Sob as pálpebras cerradas com força, Vargh sente a luz se esvaindo rapidamente.
 
Todos novamente sentem a mesma vibração que ele sentira outrora.
 
Uma tosse seca ecoa pela caverna.
 
Enquanto o grupo se vira na direção de Gundreen, que acorda desnorteado, o monge aparece rapidamente ao seu lado, se curvando na direção do anão e estendendo a mão para que ele possa se levantar:
 
- Ainda não chegou sua hora, meu amigo.
 
Gundreen sorri e aceita o apoio do monge enquanto se levanta.
 
Os mais atentos, então, percebem: a mão sombria desaparecera, mas um sorriso genuíno e raro reluz no rosto de Vargh.

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    A História do Underdark: "como um demônio quase destruiu uma sociedade sombria"
  3. A sombra de uma mão
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